' Se podes olhar, vê. Se podes ver, repara ' José Saramago

quinta-feira, 25 de novembro de 2010

De novo, com outros.

Decidiu acreditar que todos seus relacionamentos fracassados eram como copos de whisky em um domingo ensolarado. Porque além de serem por si só relacionamentos, começaram já fracassados, mas despercebidos por eles.

Nunca foi fã de domingos, muito menos de whisky, mas embriagou-se e só se deu conta ao anoitecer. Imaginou que desta vez seria diferente, e que poderia dar conta do que nunca soube dar. Sabia desde pequena que o amor lhe pregaria peças, só por ter nascido já pessimista. Não decidiu ser pessimista de uma noite para a outra. Na verdade começou a ser num sábado, e não em um domingo. Por ironia ou não, o sábado foi de chuva, e ela ficou sentada no banco da escola, sem um par de quadrilha.

A partir daí, foram como dias seguidos com trânsito lento. Sempre iguais. Perdeu um par de valsa, perdeu um amigo para brincar, perdeu um garoto bonitinho da mesma sala, perdeu um olhar na matinê, beijou um idiota só para dizer que perdeu, perdeu sentimentos em bocas estranhas, e se perdeu em relacionamentos. Fato é que, ela se perdia porque a deixavam. Ou a deixavam por falta de querer, ou por um querer tamanho.

No primeiro deles, fez se perder de propósito, e perdeu para sempre. Número de telefone, contatos virtuais, contatos visuais e tudo o mais. Eram vizinhos e acabaram por Estados diferentes. O segundo foi um carma, e perdura até hoje. Não quis perder-se, e sonhou que daria certo. Poderia até virar otimista de uma hora a outra. Quis que assim fosse, mas foi vencida por desencontros alheios. Foi perdendo-se devagarinho, entre os dedos das mãos branquinhas que ele possuía. Quando viu estava sozinha, e tinha terminado com tudo.

Desistiu de todos. Pensou convictamente que, deixou-se perder em tudo e, um dia alguém poderia achá-la. Foi o caso do terceiro e último, até o dia em que os conto. Não que ele tenha durado até hoje, e continue a durar ate amanhã e depois e que por assim há de ir. Pelo contrário. perdeu -se também, no emaranhado da lonjura.

Começou já fracassado pela forma em que foi tomando ao longo das horas. Quem dirá dos dias. Quis desistir mas não quis perder. Continuou, e fez de um tudo. Perdeu. Diferentemente dos outros. Desta vez perdeu sem saber e ainda não sabe. A deixou assim, calado. Terminou também fracassado, e levou todos os nós na garganta.

Poupei dizer que os relacionamentos foram os meus. Poupei detalhar o fim, e o começo. Imagine entao o meio. Começou, durou e acabou. É como a vida, ou como um pé de fruta.
Provavelmente minha vida amorosa tenha se resumido a maças. Não sei nem se maça vem do pé, ou vem como nos desenhos, colados nas folhas das árvores. Não importa. De fato vos digo que minha maça sempre vem com uma minhoca de brinde. O bom da minhoca é que ela sempre come a maça primeiro do que eu, e não sobra nada. Nem do doce, nem do talo.

Decidiu acreditar que todos os seus companheiros eram dignos de histórias em noites frias. Porque além de serem por si só sonhos noturnos de viajens, cheiros, sabores, casamentos, e a idéia de um "pra sempre" por muito tempo, levaram consigo um tanto de mim.
Histórias voltadas ao próprio ego nunca foram do meu agrado e talvez nunca sejam.
Perdoe-me então os três. Se é que se lembram de mim, e já não se perderam no balbuciar de tantas letras. Sabia que o amor continuaria me pregando peças, e por mais que, quando eu começasse, pensasse que não, quando acabava, ou deixava acabar dava risada e pensava que sim. Pregou. Mais uma vez.

Decidiu acreditar que falar sobre o amor e relacionamentos mal acabados era como adiantar uma fase da vida. Porque além de escrever sobre tudo o que foi, adiantou-se prevendo tudo o que estaria por vir. De novo, com outros.

quarta-feira, 27 de outubro de 2010

dedicado, beirando o começo de 2009

Ele já estava sentado, quase que beirando o sofá.
Não parecia mais o mesmo. Estava distante, calado.
Trasparecia o querer incansável do fugir.
  E eu nem ao menos encostei na tão fria carne.
Fria não pelo caráter.  Se for por esse, estaria ele quente.
Não mais naquela situação, já não poderia.
Estava frio pelo tempo acizentado que cobria o céu de são paulo.
Estava frio.
Resolvi servir. O silêncio me tornava surda.
- Um café hoje a noite ?
  Ou um whisky ? Depende da sua vontade.
  A sala fez-se em silêncio novamente.
Não existia mais assuntos sobre profissões ou malícias.
  A única se encontrava na minha cabeça, que se arrependeu em
instantes depois do oferecimento.
Malícia esdruxula. Silêncio constrangedor.
- Vontade da bebida no caso.
- Prefiro, fanta uva - saltou de sua garganta sem rodeios.
Me desfiz em pedaços, mas sabia que não poderia.
Estava certo e eu, escassa de certezas.
Queria mais era ficar calada. Falei demais.
Mas agora o que parece é que ele resolveu abrir sua bela boca.
Não poderia mais fujir, já que eu mesma comecei.
- Nada alcoolico ?
Sem perceber sorri tristemente, mas não tão forçado.
Sorri por sorrir. A malícia comia-me. E eu lutava contra pensamentos.
- Café é tão mais quente. mas já que você quer a fanta uva.
Virei-me e servi. Ofereci o que mais amava. E ele o rejeitou.
Não falo só pela bebida. Na verdade não falo mais de nada.
- Pra você um café - disse ele sorrindo.
Sorriu, e sorriu feliz.
Ele bebeu. Levantou-se e saiu.
Largou-me com todos os desejos.
  E eu apenas fiquei, fria. Seca.
Me calei,por entre os goles do café.
Na verdade era um cappuccino. Rejeitado estando, eu o tomo.
Nunca quis seduzí-lo. Na verdade ele que sempre ofereceu sua sedução a mim.
  E se não ofereceu, senti como se tal fosse feita.
Fato é que na verdade nunca nem ao menos o toquei.
  Éum professor de historia, dizia. E eu escritora.
Não seria de todo mal,se um dia talvez casassemos.
Complicado seria. Se agora ele estava tão perto, mas tão distante.
Nunca o senti. Talvez precise do toque, ou de alguns gestos.
Ou de mais alguns cumprimentos, mesmo que rapidos, como da única vez.
  É um professor de história.
  E eu não sou sua aluna, embora agora quem dera eu fosse.
Tinha várias perguntas impertinentes a aula.
Mas eram ao menos perguntas. Desculpas para um assunto.
Nunca conversei com lábios tão próximos.
Evito, já para não cometer o pecado.
  E ele por si só já foi um pecado.
E continua sendo.
  É a tentação que eu descobri por uns meses, e talvez deixei-o lá.
Ou entao mordi. Mordi com todos os dentes feito maça.
Despertou em mim vários dos 7.
  A luxúria. A gula. E a preguiça.
Desperta-me a ira agora.
Pelo relacionamento em que se encontra.
Tenho medo de não conseguir me controlar, se por inveja me encontrar tão perto
de sua boca avermelhada.
Rejeitei-o do mesmo jeito que agora me rejeita.
Me tenta do mesmo jeito que um pirulito a uma criança.
Por medo não sigo em frente.
Possui todos os pecados assim como eu.
Juntos são 14. Forma-se o 15, se assim existisse.
Medo deveria ser pecado.
  É um professor de historia. E resolveu dar aula.
Veio me ensinar sobre ilusionismo. 
Ilusionismo rimava um bocado com ilusão. Tola perguntei.
- Seria ilusão se eu começasse a gostar da sua carne, de seu espirito, ou até de suas palavras ?
Perguntei em silêncio na minha cabeça.
Perguntei por entre pedaços de papel.
  É um professor de história. Está pronto para perguntas.
Eu sou apenas uma escritora. Tenho medo das respostas.

terça-feira, 19 de outubro de 2010

cinquenta e dois, pra não mais.


Queria morrer.
Morrer por morrer, de morte morrida.
Morrer de raiva, e de mãos atadas.
Ah como o odiava.
Odiava quando a chamava de linda.
Não lembrava da voz dele, por isso talvez toda a noite deparava-se com o telefone na mão, discando seu número.
Nunca de fato ligou.
Talvez uma, ou duas vezes, por puro impulso.
É engraçado como a mente brinca com a gente.
Ligava e sem querer dizia o que não mais poderia.
Afinal de contas, talvez ele não a quisesse mais.
Pelo menos não daquele jeito.
Não sabia.
Debruçada na janela, olhando todo o mar azul.
Soluçava linda: a paisagem, a brisa.
Ela não. Nunca foi, e se foi não havia descoberto ainda.
Não queria.
De todas as palavras, a que menos gostava de escutar, com toda a certeza era linda.
A incomodava de tal maneira que parava o mundo e todos os demais sons para dizer que não.
Batia o pé, virava a cara. Birrenta.
Mas da boca dele sempre saia o linda que percorria teu corpo inteiro, e a dentro ia num palpitar querer de crença.
Era o linda mais atormentador de todos os outros.
Porque persistia, e não desistente, pronunciava inúmeras vezes ao longo do dia.
Não contente, e não o bastante seguia o linda com frases de poema e prosa, feitos por ele mesmo em segundos.
Teimava em dizer que não tinha o dom, e que este era somente meu.
Mas escrevia frases soltas em questão de piscar, de flor nascendo, vento a balançar cabelos.
"És linda, e digo mais."
Ah sim, sempre dizia. Muitas vezes mais, e bem mais.
Dizia ainda que eu não mudaria jamais.
Seria eu, linda até que seu corpo estivesse a metros da terra, lentamente se desfazendo como o nada.
Imaginava talvez o céu mudando de cor, e eu ali. Linda.
Queria até que estrelas mergulhassem no mar.
Pensei que ele, por todos os devaneios ditos, fosse louco.
Olhei então pela janela, e foi ali que vi, ainda debruçada, estrelas entregando-se ao mar, lá no fim do horizonte.
Em mais uma noite em que distante me chamou de linda, sem que eu pudesse acreditar.